Autor: Prof. Sérgio Costa
Instituição: NEPP – Núcleo de Estudos em Psicanálise
Data: Abril de 2025
Resumo.
Este artigo propõe uma reflexão psicanalítica e subjetiva sobre o feminino psíquico como potência de entrega, dor, erotismo e liberdade emocional. A partir da análise do desejo vinculado ao abandono e da ausência de espaços de escuta entre homens, o autor convida à construção de uma nova sensibilidade masculina e humana. Trata-se de um convite à escuta profunda do feminino que habita todos nós, independentemente do sexo biológico, como caminho de cura, autoconhecimento e autenticidade.
Palavras-chave:
feminino psíquico; desejo e abandono; liberdade emocional; psicanálise; subjetividade masculina; identidade afetiva.
1 Introdução
“Você me come, me cospe e me deixa.”
(Chico Buarque)
O verso de Chico Buarque, tão conhecido e recitado, revela com crueza e poesia a dor da entrega não correspondida. Mas mais do que isso: ele expressa o modo como o desejo, a entrega e o abandono se entrelaçam na vivência afetiva e erótica de muitos sujeitos. Embora muitas vezes associada à experiência feminina, essa configuração também habita muitos homens — especialmente aqueles que têm coragem de olhar para suas camadas mais sensíveis.
2 O Desejo como Ferida Acesa.
Em diversas experiências subjetivas, o desejo parece se acender exatamente quando a presença do outro começa a escorrer pelos dedos. A iminência do abandono, longe de extinguir o desejo, muitas vezes o intensifica. Há um prazer paradoxal em ser desejado e descartado, em gozar no momento exato em que se intui a partida do outro.
Essa vivência pode ser associada ao masoquismo psíquico, conforme descrito por Freud, em que o prazer se mistura com a submissão e a dor simbólica. Entretanto, há também uma leitura simbólica mais ampla: a entrega profunda como força e não como fraqueza. A vulnerabilidade pode ser um lugar de potência.
3 O Feminino Psíquico: Para Além do Gênero.
O feminino psíquico, na perspectiva psicanalítica, não se limita ao corpo ou ao papel social. Trata-se de uma posição interna diante do desejo e da vida. Um modo de se relacionar com o mundo com abertura, sensibilidade e acolhimento. É o oposto do controle, da armadura, da imposição.
Muitos homens reprimem esse aspecto em si. Mas quando se permitem tocá-lo, descobrem uma liberdade emocional inédita — ainda que sem garantias.
4. A Falta de Escuta entre homens.
Apesar das mudanças culturais, ainda há muito silêncio nas rodas masculinas sobre temas como abandono, entrega emocional e prazer em posições vulneráveis. Esses assuntos são muitas vezes tratados com zombarias, silêncio ou desdém.
Enquanto isso, nas rodas femininas, há espaço para compartilhar experiências de prazer, dor, solidão e renascimento. A ausência de um espaço seguro para que os homens falem da dor e da ternura reforça o afastamento do próprio feminino interno.
5 O Ponto de Partida Que Faltou.
Muitos sujeitos crescem sem um ponto de partida seguro. Sentem que precisam ser alguém, provar algo, conquistar reconhecimento — inclusive no amor. E por isso, não raro, buscam o desejo como forma de compensar a falta de valor sentido desde a infância.
Mas é possível reverter esse ciclo.
6 Conclusão: A Liberdade de Ser Inteiro
Este artigo é mais do que uma reflexão. É um convite.
Para que homens e mulheres reconheçam que o feminino não é um papel — é uma possibilidade de ser.
Um lugar interno onde o amor, o desejo e a dor convivem, sem censura.
Permitir-se viver esse feminino é romper com o ideal de controle e abrir espaço para a vida afetiva autêntica.
Referência Bibliográfica (opcional)
FREUD, Sigmund. O ego e o id. Obras completas, vol. XIX. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
BUARQUE, Chico. Você me come, me cospe e me deixa. In: Álbum “Francisco”, 1987.
Espetacular
Tenho orgulho de fazer parte desta escola, ser um Proponente à Psicanálise, gratidão ao doutor Sérgio equipe , os textos publicados têm sido muito bons para meu crescimento.
O feminino é inerente à condição humana, somos seres ambíguos, com aspectos yin e yang. A falta de espaços de escuta entre homens é uma problemática da nossa cultura machista, que pressiona os homens a serem fortes e não mostrarem emoções, levando a uma grande carga emocional reprimida. Para mudar isso, precisamos nos conectar com nossa essência, ser autênticos e ouvir nossa verdade interior, permitindo-nos ser mais verdadeiros e emocionalmente livres.
Tema sensacional professor.
Infelizmente culturalmente, somos levados a engolir tais comportamentos ao longo de nossa história, acreditando em vários estigmas, crenças e até mesmo no lúdico, como certo e verdadeiro, se livrar das amarras não é fácil e se abrir para o novo e real machuca, a psicanálise nos trás a tona o real, que somos humanos e temos tudo dentro de nós e portanto os sentimentos estão suscetíveis a todos.
Olá Prof. Sérgio Costa, excelente colocação. Nos leva a pensar.